sábado, 24 de abril de 2010


O MANTO SANTO


Uma noite acordei
vi que precisava de abrigo
estava frio e o corpo retorcido

No sítio uma brisa gélida assolava
o varandão que me encontrava e
novamente adormeci

Sonhei como acordada
que um grande manto-santo
cobria o corpo dormente
enrrolado feito serpente

Aos poucos, o corpo de antes
petrificado
Cedeu lugar a outro
espichado
O corpo do frio foi salvado
por aquele manto-santo sagrado
De Jesus, o cruxificado!




waykyrulitera.blogger.com: PISTILO

waykyrulitera.blogger.com: PISTILO

PISTILO

O olhar está parado
sobre o pistilo babão
ele reluz vontade amarelada

É penetrante o que ele faz
poder de vegetal muito forte sobre mim
não consigo não consentir

Me aproximo pelas mãos
elas buscam calmamente o toque divinizado
do caule em riste postado
toco-lhe a baba sagrada
a ponta está molhada
tem cheiro forte, sinto.
provo uma espécie de absintho

Afasto-me agora
olhos fixos sobre ele
lúdico e aquoso
é vegetal autopoderoso
desencadeia no outro
consentimento de gozos!

quinta-feira, 15 de abril de 2010

BORBOLETA

                                                                Cópula das certezas
                                                                 matizes de grandeza
                                          mirabolante névoa que transcende às vontades mundanas
                                                      vértice cósmico de meus instantes.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

simples

A CASA NOSTRA
A COISA NOSTRA
A OSTRA NOSSA
A ARTE VOSSA

A NOSTRA CASA
A NOSTRA COISA
A NOSSA OSTRA
A ARTE VOSSA

A CASA COISA
A COISA CASA
A OSTRA CASA
A ARTE VOSSA

A ARTE: casa-coisa-ostra-vossa!

Lucio

                                            LUCIO

lucio! lucio! lucio!
era a voz ouvida por ela sempre

A Juventude se erguia
e a passos largos
saía em disparada
seu destino já sabia: padaria!

sempre o pão! o mesmo pão!
de meio-quilo, grandão!

voltava cansada a jovem
e pensava: sempre o pão!
o mesmo pão!
buscar o pão!
comprar o pão
comer o pão!

o pão voltava como sempre seguindo a Juventude
lucio, porém, envelhecia  a olhos vistos
a noite o fazia crescer, e o dia o fazia morrer.

domingo, 4 de abril de 2010

TEU BEIJO


TEU BEIJO


Longa morte
Cautério monstruoso
Incêndio
Combustão visceral é teu beijo

Labareda-que-me-chama
Ar multiplicado nos lábios entreabertos
Desprovidos de coragem

Teu beijo...
Imã estranho
Vontade que faz dueto
Ânsia salivar
Que faz meus lábios sangrarem

FLOR-BUEIRO

Flor-bueiro

Na rua não cabia mais ninguém
Bueiro aberto desvendava flor nanica que crescia
O sol amolecia sua seiva
Ela porém resistia

A chuva era o bálsamo
Maná salvador
E a flor apontando para o céu
Progredia

À noite, silenciosa, transgredia de sua condição vegetal
Abria-se exposta
Pétalas rosáceas à mostra
Posição nada imoral

Insetos e vaga-lumes pousavam nas bordas macias
Injetando naquele lugar
Ferrões em brasa

A lua deposta
Flor-bueiro recomposta
O sol ao incidir sobre ela murchava suas pétalas
Não cabia mais ninguém no tal buraco
Era só ela!


ÁLBUM DE FOTOGRAFIAS

Fotos rôtas
Figuras amorfas
Cheias de traças
Lembram-me dos dias que foram

CHEIRO DE MOFO

Criança desdentada sou eu
Não tenho para onde ir
Destino de uma parte já foi traçado
Genética impregnada de FIM

CHEIRO DE MOFO

Virada a página
Agora é no Rio
Anos 70
Piedade suburbana
Escola pública
Tiro na esquina vem na lembrança
Mãe sozinha
Filha boazinha

CHEIRO DE MOFO

Passo cinco
Vejo Belém
Criança ta com medo
Até do apito do trem

Agora vejo três

Passo dez
Aqui
Outros tempos
Mulher-procura
Criança tem medo
A vida insiste
Está em 3D

TRÊS VIDAS
TRÊS VEZES
NÃO HÁ COMO FUGIR!
TEREI QUE CONTINUAR ATÉ O FIM!
O álbum findou
Eu cá estou
Paginadas a procurar
Onde? Onde foste parar?

O EITO


O EITO

Um dia a quinhentos anos atrás
Encontrei num canto estreito
Um fremoso e desgastado Eito
Abandonado pela fúria dos temporais
Porém vida ainda tinha


Pus meus pés descalços
Chafurdei naquele leito vagabundo
Submundo de marés anteriores
Moribundo de inconstâncias e dádiva

Deixei que meu corpo sentisse
Do eivado Eito o visgo pegajoso
Fui ao chão!
O visgo denso fazia cada parte
Chafurdada querer mais ser profanada

Não bastou, pensei:
Quero mais!
Resolvi por meus seios nus
Em contato direto com aquele chão

Pele branca esfolada se fazia...

Foi nessa hora que algo grotesco aconteceu:
Eu me via despedaçada
Carne humana degredada
Ali perdida vida-partida!

Cada parte do meu corpo
Em pedaços estava
O Eito sujo a minha boca beijava
E o resto do corpo, deflorava

E cada vez que eu corria em partes
Algo dentro de mim morria
Mais profundo o leito do Eito ficava
Corria eu então desesperada
A modo de juntar as partes esquartejadas

Passaram-se sete dias nessa agonia
Até que o Eito foi recomposto pela chuva tropical
E derrepente ao olhar pr’um canto
Vislumbrei um olho d’água
Abaixei e provei como encantada...
Era água salgada!

Não resisti, fiquei tentada
Novamente fui ao chão!
C’ôa boca posta em brasa
Sorvendo cada milímetro
Daquele PH de água brotada!